sábado, 22 de novembro de 2008

Os Sinos da Plena Consciência

Os Sinos da Plena Consciência

(Capítulo do livro de Thich Nhat Hanh "The World We Have",
tradução de Samuel Cavalcante)


Os sinos da plena consciência estão soando. Em toda a Terra, estamos experimentando inundações, secas e grandes incêndios naturais. O gelo está derretendo no Ártico e os furacões e ondas de calor estão matando milhares. As florestas estão desaparacendo rapidamente, os desertos estão se expandindo, espécies estão se extinguindo todos os dias e, mesmo assim, continuamos a consumir ignorando esses sinos que estão soando.

Todos nós sabemos que o nosso lindo planeta verde está em perigo. Nossa maneira de caminhar na Terra exerce uma grande influência nos animais e nas plantas. Mesmo assim, agimos como se nossas vidas cotidianas não tivessem nada a ver com as condições do mundo. Estamos como sonâmbulos, sem saber o que estamos fazendo ou para onde estamos indo. Se podemos acordar ou não vai depender de podermos caminhar com plena consciência sobre nossa Mãe Terra. O futuro de toda a vida, incluindo a nossa própria depende dos nossos passos vigilantes. Temos que ouvir os sinos da plena consciência que estão soando por toda a terra. Temos que começar a aprender a viver de um modo que o futuro seja possível para nossos filhos e netos.

Tenho sentado com o Buda por um longo tempo e o tenho consultado sobre o aquecimento global, e o seu ensinamento é bastante claro. Se continuarmos a viver como temos vivido até agora, consumindo sem pensar no futuro, destruindo nossas florestas e emitindo quantidades perigosas de dióxido de carbono, então mudanças climáticas devastadoras serão inevitáveis. Muito do nosso ecossistema será destruido. O nível do mar se elevará e cidades costeiras serão inundadas, forçando a saída de milhões de refugiados, criando guerras e epidemias de doenças doenças infecciosas.

Precisamos de um tipo de despertar coletivo. Entre nós, existem homens e mulheres que estão atentos, mas isso não é o suficiente; a maioria das pessoas está dormindo. Construímos um sistema que não podemos controlar. Ele se impôs a nós e nos tornamos seus escravos e vítimas. Para a maioria de nós que deseja ter uma casa, um carro, uma geladeira, uma televisão etc, precisamos sacrificar, em troca, nosso tempo e nossas vidas. Vivemos sob constante pressão do tempo. Antigamente, poderiamos dedicar três horas para tomar uma xícara de chá, desfrutando da companhia dos amigos em uma atmosfera serena e espiritual. Podíamos organizar festas para celebrar o desabrochar de uma orquídea em nosso jardim. Mas hoje não podemos mais fazer tais coisas. Dizemos que tempo é dinheiro. Criamos uma sociedade na qual os ricos se tornam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres e na qual ficamos tão emaranhados em nossos próprios problemas imediatos que não temos mais condições de estar atentos ao que está acontecendo com o resto da família humana em nosso planeta terra. Na minha mente eu vejo um grupo de galinhas numa gaiola disputando um punhado de grãos, sem se darem conta de que em poucas horas irão todas ser mortas.

Os povos da China, Índia, Vietnã e outros países em desenvolvimento ainda estão sonhando o “sonho americano”, como se esse sonho fosse o objetivo absoluto da humanidade – todo mundo tem que ter um carro, uma conta bancária, um celular, uma televisão, só para si. Em vinte e cinco anos a população da China será de 1,5 bilhões de pessoas e se cada uma quiser dirigir seu próprio carro, ela precisará de 99 milhões de barris de petróleo por dia. Mas o mudo só produz 84 milhões de barris por dia. Então, o sonho americano não é possível para os povos da China, Índia ou Vietnã. O sonho americano não é mais possível nem mesmo para os próprios americanos. Não podemos continuar a viver dessa maneira. Não é uma economia sustentável.

Temos que ter um outro sonho, o sonho da fraternidade, da bondade amorosa e da solidariedade. Este sonho é possível aqui e agora. Temos o Dharma, temos os meios e temos sabedoria suficiente para sermos capazes de vivermos esse sonho. A plena consciência é o coração do despertar, da iluminação. Praticamos a respiração consciente para sermos capazes de estar aqui no momento presente de modo a reconhecer o que está acontecendo em nós e em torno de nós. Se o que está acontecendo dentro de nós é desespero, temos que reconhecê-lo e agir imediatamente. Talvez a gente não queira se confrontar com essa formação mental, mas é uma realidade, e temos que reconhecê-la para podermos transformá-la.

Não precisamos afundar no desespero por causa do aquecimento global; podemos agir. Só assinarmos uma petição, um abaixo-assinado, não vai ajudar muito. Ação urgente tem que ser feita nos níveis individual e coletivo. Todos nós temos um grande desejo de sermos capazes de viver em paz e em uma sociedade ambientalmente sustentável. O que a maioria de nós ainda não tem são maneiras concretas de fazer do nosso compromisso de viver de forma sustentável uma realidade de nossa vida no dia-a-dia. Não nos organizamos para tal. Não podemos apenas culpar os governos e as corporações da indústria química que poluem nossa água de beber, pela violência em nossos bairros, pela guerra que destrói tantas vidas. Já é tempo de cada um de nós acordar e tomar uma atitude em nossas próprias vidas.

Nós testemunhamos a violência, a corrupção e a destruição à nossa volta. Todos sabemos que as leis que temos não são fortes o bastante para controlar a superstição, a crueldade e os abusos de poder que vemos diariamente. Somente a fé e a determinação podem impedir que caiamos em um profundo desespero.

O budismo é a mais forte forma de humanismo que temos. Ele nos ajuda a aprender a viver com responsabilidade, solidariedade e amor. Cada praticante budista deveria ser um protetor do meio ambiente. Temos o poder de decidir o destino de nosso planeta. Se acordamos para nossa situação, haverá uma mudança na nossa consciência coletiva. Temos que fazer algo para despertar as pessoas. Temos que ajudar o Buda a despertar as pessoas que estão vivendo em um sonho.

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